É uma história original... foi escrita já tem algum tempo e salvou-se da fogueira porque eu gostei do resultado... não sei bem porque estou postando ela aqui, acho que cansei de guardá-la na gaveta e resolvi compartilhá-la com vocês. Espero que ela seja bem recebida.
A jazz band soltava acordes de sax, e eu e a vodca dançavamos uma valsa lenta. Perdi o equilíbrio ao perceber seus grandes olhos de mar derramando-se sobre mim. Perdi o fôlego quando, qual mariposa atraída pela lâmpada, você veio sentar-se junto a mim. Com o dedo em riste para o garçom você pediu água com gás, mas eles não tinham mais.
Cecília, ouvi você dizer, quando eu reuni coragem pra perguntar o seu nome, muito prazer, Cecília. Era como se você fizesse parte de uma fotografia em P&B. Todos os outros no salão com seus ternos cinzas, casacos grafite e dentes brancos Colgate, cabelos grisalhos, cabeças pálidas e em primeiro plano, você, visão em branco prateado, com o corpo recostado de lado com um copo de coca light em mãos.
Falamos de coincidências, grandes coincidências. Amores, vícios, cigarros,Almodóvar, Frida, DaVinci, et cetera. Rimos. Sua risada alta e bela. Seus dentes todos abertos. Cada riso, os seus lábios soando aos meus ouvidos doces como arcos de violino. Em meio ao meu devaneio ouvi você dizer crina de cavalo. Sim, você me perguntava, você sabia que arcos de violino já foram feitos de crina de cavalo?
Pensando em meus dedos, no que eles fariam se cordas de violino fossem, baixei meus olhos para os teus pés. Olhei em torno de você. Sua face límpida, nua de qualquer maquiagem, seus cabelos negros, emaranhado de cachos descendo sobre as costas nuas, e sobre o vestido de algodão branco miçangas azuis esboçavam uma revoada de borboletas.
Examinei também o nosso redor. Olhei para aquele estéril salão, em que machos e fêmeas alheios entupiam-se de empadinhas e docinhos. Voltei então os meus olhos novamente para você, refúgio em meio ao caos da mediocridade, apenas em tempo de ouvir de seus lábios, um "tchau, preciso ir, quem sabe nos encontramos um outro dia". A inércia da surpresa me impede de fazer qualquer movimento. Só, assisto você se afastando. A jazz banda ainda solta acordes de sax. E eu? Eu comprei um violino que nunca cheguei a tocar.